Não faz nem uma semana desde que o vi. O sol castigava os delgados ombros daquele jovem que, trajado apenas de um manto encardido e calçado de velhos sapatos de bico fino rasgados nos calcanhares, caminhava penosamente, mal suportando o saco em seus ombros, que balançava largamente de um lado a outro fazendo seu interior tilintar sonoramente. O rapaz seguia em direção ao Oásis dos Venais, mas com certeza não sobreviveu o suficiente para chegar lá. Eu mesmo vinha de lá fazia horas e, mesmo a camelo estava exausto da viagem, simplesmente não tinha como ele sobreviver. Mas que vá ao inferno esse garoto! Aquilo que ele carregava nas costas que me interessava, sem dúvidas se não era valioso ao menos renderia bons cobres. Minto! Aquele brilho metálico dourado que me cegou as vistas por um momento não era delírio ou miragem coisa alguma, o sujeito tinha às costas riquezas que muitos não viveriam o suficiente pra consumir.
Vocês não fazem ideia do alívio foi me aproximar e confirmar minhas suspeitas, aquilo sem dúvidas era ouro e eu juraria que o garoto estava a beira da morte. Bastava um corte da minha adaga. Apenas um! E pronto, tudo aquilo seria meu e ninguém me julgaria por isso. Afinal, que me fariam? Todos por aqui são condenados desde o nascimento. Eu tava quase com as mãos no punho da arma quando algo me arremeteu. Não foi o olhar do rapaz, ele prosseguia sem sequer olhar para trás na minha direção. Não... Foi algo muito pior, tanto ouro, tanta ausência de perigo, só podia significar três coisas: Que o rapaz era conhecido de gente importante; que era um demônio de sede insaciável; ou que já aceitara a morte e caminhava apenas para abraçá-la o quanto antes. De uma forma ou de outra, não fazia mal perguntar:
— Saudações, jovem andarilho! O que te faz carregar tamanho fardo?
Ele não respondeu nada, sequer virou o rosto, era como se tivesse areia nos ouvidos. Mas eu não podia desistir, se o garoto fosse ao menos conhecido de um bem nascido eu tinha tirado a sorte grande.
— Eu posso ajudá-lo, é perigoso prosseguir sozinho. Principalmente com... Isso.
Sabem. Talvez tivesse sido melhor segui-lo calado, ou talvez ter ido embora sem tê-lo visto. Pois quando apontei praquilo nas costas dele, que era ouro e não delírio ou miragem, ele cessou a marcha e se pôs imóvel como uma estátua. Aquele desequilíbrio de bêbado em alto mar, aquela sensação de morte iminente, aquela promessa de expressão vazia... Tudo! Tudo isso o abandonou e invadiu a mim! Sim, até a promessa da expressão de seu rosto, o maldito finalmente olhara na minha direção. Seu semblante frio e sereno como um lago calmo em noite de lua cheia me petrificou, seus olhos marrons pareciam devorar a luz do sol como num eclipse e essa mesma luz desse sol apagado fazia o castanho de suas íris brilharem vermelho, tal qual a lua de sangue. Naquele momento eu tive certeza de duas coisas aquele rapaz não era bem nascido ou conhecido de gente importante... e tampouco tinha aceitado a morte.
Habso Grobbi
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